Esse post deveria ter sido feito “a quente”, mas está sendo feito quase um ano e meio depois que chegamos em Montreal. Digo isso porque quando o tempo passa e as emoções esfriam, a perspectiva muda. Mas, vou tentar aqui canalizar como me senti naqueles dias.
Pouco antes de me mudar pra cá, tivemos que sair da nossa casa alugada em Jacuípe e lidar com todo o processo que isso envolvia: distrato, mudança de nome das contas de luz, água e internet, tive que me desfazer de praticamente tudo o que tinha, doei muita roupa e sapato, móveis e eletrodomésticos, programei um carreto pra deixar tudo que eu ia doar pra Tita na casa dela, alugar os airbnbs que a gente iria ficar na viagem de volta de carro pra São Paulo com os 2 gatos. Foi uma logística pesada, eu à frente de praticamente tudo porque Raphael ainda estava trabalhando durante esse processo. Tudo isso durante a pandemia que ainda estava intensa e eu segui rigorosamente fazendo distanciamento social.
Quando finalmente chegamos no airbnb em São Paulo, era inverno. A casa era confortável e espaçosa, bem charmosa, mesmo. Lembro de pensar na época que seria gostoso morar nela. Mas a gente estava prestes a nos mudarmos não só de casa, como de país.
Um mês se passou e foi uma correria para arrumar as últimas coisa: documentos de viagem dos gatos (que só isso daria um post à parte), venda do carro, aluguei um carro pra resolver as coisas, exames médicos andes de viajar, visitei Tamiris em Indaiatuba, até suspeita de covid19 eu tive. Comprei as malas da viagem, compramos as passagens, os dólares, arrumamos as malas e assim chegou o dia de ir.
O que eu posso dizer é que no dia da viagem eu estava bem nervosa. Medo de avião, medo da mudança, medo da covid19, dos gatos passarem mal e se mijarem ou cagarem nas caixinhas. Lembro do meu relógio ficar apitando pra avisar que meus batimentos cardíacos estavam acima do normal pra quem tava em repouso. Eu quis usar uma roupa alegre e confortável pra amenizar o desconforto das máscaras que estávamos usando. Olhando agora, posso dizer que deu tudo o melhor que poderíamos desejar. Não tivemos problema com documentos, os gatos se comportaram, a única parte que foi mais chata é o avião porque eu tenho medo e o vôo estava lotado, os gatos ficaram miando praticamente o vôo inteiro, principalmente Seth, e era tudo muito apertado. Então foi desconfortável, mas não tinha como ser de outro jeito. Felizmente eu lembro que não teve tanta turbulência, mas eu não consegui dormir as 10 horas seguidas.
O vôo era durante a noite. Saímos de São Paulo 9pm e chegamos em Montreal 6am. Como eu disse, o vôo foi tranquilo, apesar de tudo apertado e os gatos reclamando. Eu sabia que não estava incomodando ninguém além de mim porque o barulho da aeronave abafava os miados, mas eu conseguia escutar os dois. Pra eles deve ter sido muito estressante, sobretudo porque eles estavam no chão do avião e o barulho pra eles por 10 horas seguidas deve ter sido horrível.
Chegando no aeroporto de Montreal, eu me lembro do alívio de termos chegados vivos, sãos e salvos. Eu me lembro que antes de embarcarmos eu imaginei que eu ia ter uma crise de choro, ia desmaiar, ia acontecer qualquer coisa assim bem dramática, diante do impacto do marco que estávamos vivendo na nossa vida. Nada disso, eu estava no modo pragmático de resolver as coisas. Tinha que passar na imigração, pegar as permissões de estudo e trabalho, inclusive teve o momento que na entrevista com o oficial eu disse que eu tinha recebido uma bolsa de estudos chamada “America’s grant” e o oficial simplesmente me questionou por ter recebido a bolsa falando que eu não era americana. Aí eu disse que eu era americana sim porque eu tinha nascido na América do sul que era um continente só. Aí eu vi o oficial ficar pálido e me responder que eu tinha razão, não fez mais perguntas e entregou os papéis.
Pensando bem, ali eu já deveria ter percebido esse red flag sobre as pessoas daqui, mas essas questões eu vou tratar em outros posts mais pra frente. Documentos emitidos, gatos liberados por um outro oficial zero gentil, ninguém falou a tal frase “welcome to canada”, fomos embora pro nosso apartamento com o transfer que eu agendei. E aí no carro Raphael lembrou que esqueceu no avião os remédios dele. De cara um prejuízo de dez mil reais por pura teimosia e imaturidade dele, mas eu simplesmente decidi não esquentar a cabeça com isso porque apesar de ser uma grana altíssima, brigar era a última coisa na minha lista de prioridade porque eu queria que a nossa chegada fosse unida e o mais próximo de feliz possível.
Minha ansiedade não deixa viver o presente, mas eu tentei ao máximo saborear o momento. Como era esperado de mim, eu sentia ondas de alívio misturadas frios na barriga pelo que tínhamos acabado de fazer: mais de dez anos depois, nos mudamos pro Canadá.